terça-feira, 27 de abril de 2010

Metamorfose urbana (Dama da noite)

Olá!
O tema da atualização de nº199 do Anjos de prata foi "Dama da noite".
Achei muito interessante e não tive grandes dificuldades para desenvolver o texto com o tema proposto;em menos de vinte minutos nascia o "Metamorfose urbana", título que escolhi para ele.Já está publicado no site, li os outros textos dos demais escritores e tem muita coisa boa postada dentro desse tema, quem quiser conferir, tenho certeza, vai gostar!
Espero que gostem do trabalho!
Bjú!
Capitu.




METAMORFOSE URBANA.(Dama da noite).

Quem a via chegando no calçadão, trajando um minúsculo pedaço de pano ao qual chamavam de mini-saia, os seios muito pouco cobertos, calçava botas de saltos altíssimos e muitos adereços pelo corpo como enfeite. Nos cabelos um aplique fazia um longo rabo-de-cavalo. Seu perfume, forte e vulgar, se espalhava pelo vento da noite, acompanhando os movimentos quase em câmera lenta do seu corpo no vai-e-vem dos seus passos, os quais faziam balançar suavemente os largos quadris. Usava maquilagem pesada, com cores fortes, chamava a atenção até mesmo de quem passava à distância. Trazia também muito brilho nos minúsculos trajes e espalhados pelo corpo, como se embalsamado com purpurinas. Quem a via chegando com ar de profissional da noite que sabe bem o que está fazendo e o que quer da vida, não imagina que por trás daquela mulher aparentemente vulgar se esconde uma mãe ávida por alimentar os filhos que teve num momento de paixão a dois mas a que agora sozinha sustenta.

Quem a via se dirigindo decidida até os carros que paravam para vê-la e a chamavam para negociar o único produto que possuía para lucrar, seu corpo, não imaginava que em cada passo que dava levava consigo a insegurança do desconhecido, a incerteza do pagamento no final de tudo, o medo de adentrar no automóvel para um destino incerto e do qual não podia precisar se voltava, nem em que tempo.

Quem a via voltando ao calçadão depois do trabalho cumprido, saindo do carro com ar de felicidade, sorrindo e acenando para o desconhecido que a deixava e se ia, não podia imaginar o que havia se passado na sua cabeça nas poucas horas em que cumpria o seu papel profissional. Não podia ter medo, não podia ter nojo, não podia exigir... Seu papel era cumprir o dever de proporcionar prazer aquele que por alguns minutos era como se fosse seu dono, seu amo e senhor. Nada sentia. Seu corpo não respondia a nenhum estímulo e tudo o que aparentemente era puro prazer não passava de encenação. Seus gestos, seus gemidos, suas frases curtas, seus muitos elogios. Tudo ensaiado para uma interpretação perfeita, onde nada podia dar errado. Era o seu trabalho.

Quem a via sentada no calçadão ao final da madrugada, exausta, retirando as botas dos pés, o aplique dos cabelos, os cílios postiços, de cabeça baixa a retirar o dinheiro da minúscula bolsa, não imaginava que metade daquele ganho suado não podia ser seu. Tinha que entregá-lo ao "dono da rua" se quisesse voltar na noite seguinte e garantir um lugar no calçadão. Nem pensasse ela em não fazê-lo!Isso podia lhe custar a vida, melhor não arriscar, seus filhos precisavam dela viva!

E assim, dia já quase amanhecendo, lá estava ela dentro do banheiro, nos fundos de um botequim sujo a começar sua metamorfose urbana. Ali ficavam as vestes, os adereços e a água fria do chuveiro levavam para o ralo a maquilagem e o brilho das purpurinas que faziam brilhar o seu corpo. Olhava-se no espelho enquanto secava os cabelos e a imagem refletida era a de uma mulher de rosto sofrido, de olhos sem brilho que em nada lembrava a dama-da-noite que entrara minutos atrás. Daquele banheiro frio saía uma jovem trajando uma humilde calça jeans, blusinha básica, sandálias rasteiras e os cabelos presos num discreto coque. Antes de sair do bar, cumprimentava sorridente o balconista para o qual dava alguns trocados como pagamento pelo banho tomado nos fundos do local. E lá ia ela cabisbaixa em direção a porta de saída, sem olhar para os primeiros fregueses que já bebiam cedo no lugar.

Horas depois ela podia ser vista saindo do trem. Já era dia claro, o sol brilhando forte. Ela caminhava em direção a padaria onde comprava pão e leite, conversava rapidamente com alguns vizinhos e em passos rápidos se dirigia ao pequeno portãozinho de madeira que dava acesso a uma casa muito humilde, de cômodos pequenos. Ela entrava pela porta da cozinha, sem fazer muito barulho, beijava a mãe que já preparava a mesa do café. Antes de fazer qualquer outra coisa passava no quarto dos filhos que ainda dormiam e os beijava carinhosamente. Só depois, se trocava e os acordava para o café da manhã.

Quem a via agora alegre na mesa junto da sua mãe e dos seus filhos a fazer a primeira refeição do dia, aquela que outrora por muitas vezes tinha sido também sua única refeição, conseguia compreender como é possivel passar por tamanha transformação do dia para a noite em nome da sobrevivência.

E o seu dia assim passava... Pela manhã brincava com os filhos e a tarde, depois de contemplar a comida que pôde colocar na mesa para o almoço e saber que o jantar não faltaria, dormia profundamente para ao final da tarde estar descansada e poder recomeçar... Recomeçar mais uma metamorfose urbana entre a discreta mãe de família e a exuberante dama da noite, que em comum somente tinham em si uma mulher batalhadora... filha... e mãe.

Autor: Capitu-RJ

18 comentários:

  1. Que perfeito,retratou com perfeição a metamorfose de muitas mulheres,parabéns irmã,bjo... que verdade,estou emociada com o texto!

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  2. Obrigada pelocomentário irmã do peito!
    Super bjú!

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  3. Veio aos olhos lagrimas de emoção, respeito e orgulho, por que sei que relata a realidade de muitas damas da noite ,parabéns vc consegue neste texto nos transportar e eu me senti vendo e ate conhecendo esta mulher ...emoção e sensibilidade este e seu nome bjks boa sorte sempre.... margareth d´osun

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  4. Ester

    Olá Cleide, muito bom o texto... parabéns, bjusss...

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  5. PARABENS TEXTO PERFEITO EMOCIONANTE A FLOR DA PELE, BEM EALABORADO VERDADEIRO BJKS VANESSA

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  6. amei,esta perfeito e a perfeiçao é atributo para poucos parabens e mil bjuxxxx!!!

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  7. Texto perfeito, escrito com clareza e maestria!!! Parabéns prima!
    Você conseguiu Fazer emocionar com um tema "comum". Quantas Damas da Noite nos passam despercebidas...

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  8. Querida Cleide!
    Parabéns pela sensibilidade com que descreveste tão bem um quadro da vida real onde vemos "mulheres de vida fácil" serem transformadas, em nome de uma sobrevivência, passando por "momentos tão difíceis".
    Beijos.

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  9. Parabéns qrda,vc nos brindou com um texto lindo
    maravilhoso de uma sencibilidade impar tocante e
    ao mesmo tempo a realidade crua da tão falada vida fácil q de fácil só o nome e vc descreveu com leveza e riquesa de detalhes um tema forte real.Ta lindo perfeito emocionante.
    BRAVO...qnd o livro for lançado me avise.
    Deus te abençoe cada vz + bjus.

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  10. Minha (eterna) mãe Margarete, obrigada pelos comentários aqui e no orkut.O termo "meus respeitos" que usou com tanta humilade, vindo de vc pesa muito!
    Esterzinha...mil bjús pra ti tb querida!Saudades!
    Primas!!!!Que alegria ter o comentário de vcs aqui!Obrigada por esta força!Super bjú em todas!
    Tia Ermelinda, nossa eterna professorinha, obrigada pelo comentário! Pessoas como vc são únicas!Faz muita diferença na vida dos eternos alunos!Bjú!
    Tia Moiva!Obrigada pelo carinho e pela força nesse trabalho tão difícil de se conquistar um espaço como o de escritora!Um super bjú,linda!
    Capitu.

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  11. Nossa, Capitu!
    Lemos, lemos, lemos e não imaginamos que o caminho da personagem seja esse.
    Nem tudo é o que parece ser...
    Há várias pessoas assim, como ela. Não necessariamente com a mesma história.
    Gostei muito!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
    Parabéns!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

    Bjokas, Pá!

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  12. Oi Capitu! Aqui estou eu!
    Adorei o texto!
    Retrata perfeitamente milhares de mulheres que são tão mal vistas, mas que não tem a possibilidade de mostrar que, muitas vezes, se deparam com essa única alternativa para proporcionar o mínimo para a família.
    Parabéns!!! Bjão!

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  13. Ao Ler Este Texto Eu Me Teletransportei-me Para a Realidade Vivida Por Tantas Damas Da Noite Parabéns pelo texto e dos mais bem escritos que ja pode ler com a fraqueza e sem limites de interpretação belíssimo

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  14. Paloka!
    Minha amigaça!Obrigada pelo comentário! Que bom que gostou!
    Te amodoro!
    Narinha!
    Sabia que vc demorava mas vinha!Faz diferença pra mim e muuuuita!Obrigada pela força no blog!
    Milla!
    Sabia que vc ia gostar amadinha!Espero te ver mais vezes no meu blog!
    A todas um super bjú!!!!!!!!!!!!!

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  15. Adorei o texto!É um retrato fidedigno da dura realidade visto com uma sensibilidade sem tamanhos! Parabens pelo prêmio, pelo seu dom e por ser esta pessoa alegre e criativa! Beijos Henrique(INTO)

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  16. Henrique!!!
    Meu nego mais lindo que o INTO que já viu!
    Obrigada pelo comentário tão carinhoso e por visitar o blog!
    Espero te ver outras vezes por aqui!
    Saudade de vcs do andar!
    Bjú pra vc e pra minha "sócia",rsrsrsrsrs,tb!

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  17. Primeiro, parabéns por escrever sobre esse tema, de um trabalho tão carregado de preconceitos. Segundo por fazer uma descrição tão bela, e clara de uma rotina como outra qualquer de trabalhador na nossa sociedade. A Dama da noite assim como qualquer outro que precisa vender sua força de trabalho para sustentar-se e a seus filhos, honrrando papel de mãe responsável, por isso mesmo não vejo diferença, o problema é uma sociedade altamente moralista e capitalista que nega oportunidade, excluí, elitiza, que ñ dá oportunidades iguais pra todos, e aí onde mora o preconceito ja que elitizaram até valores, pobre não vale nada, negro, índio, gay, dama da noite, ou uma simples mulher, filha, mãe, negada sob o domínio desumano do capital. Maravilhoso texto, engrandece a alma em lê-lo. :)

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Bem vindas pessoas de bem com a vida, de bem com o mundo, de bem consigo mesmas!